25 de julho de 2008

Um grande amigo


Das janelas das salas e do refeitório, as crianças gritavam pedindo uma colocação na fila. Tanta euforia era para andar em Poli, uma pônei fêmea que o aposentado Mauro Kroll comprou para a neta Rafaela, que tem cinco anos e mora em Esteio. Tio Mauro, como é chamado, é o amigão de toda comunidade de São Pedro do Maratá. Ele cuida de Poli para a neta e aproveita para divertir os alunos da Escola Augusto Ambrósio Rücker com o animal.

Primeiro a andar, Felipe Tavares Lopes, de 8 anos, estava com um certo receio de andar na pônei, mesmo já tendo convivido com os cavalos que seu pai usava para trabalhar. Cheia de coragem, Danieli Cristine Willers, de 7 anos, contou que já anda em cavalos grandes, por isso não tem medo do pônei, mesmo sendo a primeira vez que montava na espécie.

Tio Mauro ajuda como pode a escola da localidade onde mora. “Minha esposa é professora aposentada. Sempre acompanhei o trabalho dela, por isso, sei das dificuldades que os educandários enfrentam para oferecer coisas diferentes aos alunos.” Esta vontade de ajudar fica nítida no semblante de Mauro, cujos olhos brilham quando vêem o sorrido das crianças.

Há cinco anos, Mauro se aposentou pela Companhia Petroquímica do Sul (Copesul) e optou por viver em Maratá, em uma chácara em São Pedro. “A comunidade me aceitou muito bem”, relata o marataense, que integra o Centro de Tradições Gaúchas (CTG) local, Encontro das Águas.

Tio Mauro tenta contribuir da forma sempre. Na Semana Farroupilha do ano passado, ele e outros membros do CTG levaram a Chama Crioula até a instituição, fizeram churrasco, ensinaram a encilhar e andaram à cavalo. “Eu vim para somar”, resume, enquanto puxa conversa com os estudantes.

Resgatando antigas brincadeiras
Para a Gincana Colonial, quando é comemorado o aniversário do município, Mauro fez um carrinho de lomba e depois doou à escola. Em todos os recreios, Bruno Metz, de 11 anos, é o responsável por pegar o brinquedo, organizar a fila e guardar o carrinho. Gabriel Luís Krug, de 8 anos, gostou tanto da idéia que fez um para ele ter em casa. “É muito legal”, resume.

O aposentado também comprou uma charrete, que pode ser usada para entretenimento das crianças, e já se ofereceu para fazer outros brinquedos, comuns na sua infância. Ele destaca que é uma forma de resgatar antigas formas de diversão, que os alunos de hoje em dia não conhecem. “Eles só querem saber de jogos eletrônicos”, observa.

16 de julho de 2008

Em nome da fé



Em fevereiro de 2008, com 17 anos e recém-formada no Ensino Médio, Daiane Aline Ertel tinha muitas dúvidas quanto ao seu futuro. Não era, porém, dúvidas comuns aos jovens da sua idade. Ela estava dividida entre a vida leiga e a religiosa. A decisão ocorreu ainda no mesmo mês, quando ela se mudou para Canoas e se juntou às irmãs da Divina Providência. Como se deve imaginar, a escolha não foi fácil.

Para ela, que trabalhava na Paróquia Três Santos Mártires das Missões, de Salvador do Sul e coordenava o Curso de Liderança Juvenil (CLJ) da cidade, o mais difícil foi optar por deixar a família, os amigos e o movimento de jovens católicos. “A gente tem de abrir mão de muita coisa, este é um desafio a superar.”

Daiane conta que sempre pensou em ser irmã e que as pessoas mais próximas sabiam deste desejo. “Mas quase ninguém acreditava realmente que eu fosse para o convento.” A jovem revela que apenas uma pessoa disse para ela não ir, mas os demais deram apoio para que ela tivesse esta experiência.

O chamado de Deus
Para os católicos, a vocação é um chamado de Deus. O mais difícil, na maioria dos casos, é entender este chamado e saber respondê-lo com sabedoria. Para fazer a escolha certa, é preciso pensar muito, evitando tomar uma decisão precipitada. Foi o que Daiane fez.

Quando pequena, a salvadorense atuava como coroinha. O início da caminhada na Igreja foi seguida pelos irmãos menores e Daiane começou a acompanhá-los. Nesta convivência com o meio cristão, ela conheceu irmãs da congregação Imaculado Coração de Maria, que a convidaram para conhecer o convento.

“Fui a diversos encontros e lá tive um discernimento de que era isso que eu queria, pois fui conhecendo o carisma da congregação e os projetos desenvolvidos pelas irmãs.” Daiane revela que, nos retiros promovidos nos conventos, são realizadas dinâmicas que ajudam os jovens a conhecerem a instituição e a si mesmos. “Quando voltava dos encontros, dizia que era isso que eu queria, mas passava um tempo em casa de novo e já ficava em dúvida”, conta Daiane, enfatizando que isso é natural.

Como ocorre em um casamento, a vida religiosa exige que a pessoa que se esteja aberta às coisas novas e que ela não tenha preconceito, mas coragem de assumir esta vontade. Apesar de ter decidido ir para um convento, a jovem revela que ainda não sabe se será irmã. “Estar indo para lá não quer dizer que serei religiosa, depende de como vai estar no meu coração e de como vou me sentir. Esta dúvida vai permanecer por um bom tempo.”

Uma pessoa normal
A salvadorense surpreendeu o rapaz com o qual se relacionava. “Eu já tinha comentado com ele sobre o assunto. Quando as irmãs me fizeram o convite para ir morar com elas, me deram uns 10 dias para pensar. Terminei com este menino logo no início deste período, para que eu pudesse refletir bem. Só depois ele soube que eu iria para o convento”, conta, observando que a relação não era namoro.

Daiane destaca que sempre foi uma jovem normal, como qualquer outra. “Sempre gostei muito de dançar e de ir a festas. Só não ia muito porque a minha família é bastante rígida.” Ela diz que, como qualquer outra jovem, se interessa por meninos e que escolher a vida religiosa não é algo extraordinário. “Muitas pessoas têm vergonha de assumir que já pensaram nisso.”

Além da coragem de reconhecer este desejo, também é necessário ter força para voltar atrás. “Ninguém precisa ser padre ou irmã se não quiser. Tem que ter coragem de voltar e dizer que aquela vida não é para mim.”

Os planos de futuro
A Divina Providência incentiva as irmãs a terem uma profissão que possa ser utilizada em prol dos trabalhos do grupo. A congregação cuida de hospitais, por isso, há freiras médicas e enfermeiras. “Elas são bastante envolvidas com a comunidade e realizam muitos projetos com crianças carente”, exemplifica Daiane, que pretende estudar Teologia e Música, para dar aulas.



A jovem conta que a congregação permite que ela visite a família e também receba parentes e amigos no convento. Ela revela, porém, que a entidade possui muitas atividades, que provavelmente tomarão seu tempo. Para matar a saudade, Daiane usará de meios tecnológicos, como MSN, Orkut, e-mails e celular, que são liberados no convento. A expectativa é a melhor possível. “Acho que tem tudo a ver comigo e acredito que vai me trazer felicidade.”

7 de julho de 2008

Cana: de fonte de renda a lazer


O trabalho com a cana iniciou há 23 anos. Odair Pedro e Erozilda de Souza possuem alambique e produzem cachaça em casa. Com a cana, também é produzido melado, schmier, bala, rapadura e até sabão. Para os moradores de Rincão dos Brochier, a atividade hoje é feita como lazer, mas sempre contribuiu para a renda da família, que também tem criação de animais e atividades ligadas ao carvão.

A matéria-prima é plantada e colhida por eles, nos fundos de casa. O processo ainda é um pouco artesanal, apesar dos novos equipamentos para o alambique, adquiridos há três anos. Embora não seja a principal fonte de renda da família, a produção de cachaça e derivados da cana sempre motivou o casal. Odair fez curso durante um ano sobre a bebida, que abrangia desde o plantio da cana até o final do processo da composição da cachaça. “Fizemos visitas em Belo Horizonte e São Paulo, para conhecer, trocar experiências”, revela o agricultor.

De Minas Gerais, Odair trouxe mudas de cana, com as quais produz a cachaça. A bebida é vendida, na maioria das vezes, por encomenda. Os agricultores garantem que o produto é diferenciado. “Temos clientes de cidades como Novo Hamburgo, Montenegro e Salvador do Sul. Muitos vêm buscar para um evento especial, para levar para praia ou para ter uma bebida diferente em casa”, conta Odair.

Para os licores, como de abacaxi e de jabuticaba, feitos cm a cachaça, são utilizados apenas frutos que a família produz. "Se fosse mais novo, investiria mais nessa área, porque gosto muito", diz Odair, esperando que algum filho ou neto prossiga com a atividade no futuro.

Tudo se aproveita
A cana pode ser dividida em três partes: a cabeça, a cauda e meio. A primeira, considerada muito forte, não é utilizada para a produção de cachaça. “É quase álcool puro, por isso é bom para fazer sabão”, explica Erozilda. Com a calda, mais fraca, pode-se fazer uma cachaça de segunda linha, igualmente boa, mas não comparada com a feita com o miolo da cana.


Outro diferencial da família são as balas de cachaça. Receita que Erozilda guarda em segredo. “Eu trouxe de Minas Gerais”, diz Odair. “Acho que só nós fazemos na região”, arrisca.

6 de junho de 2008

Churrasco sem fumaça


Há quatro anos, o comissário de bordo aposentado Gilberto Kettermann está trabalhando na fabricação de um carvão diferente. O produto é feito da moinha, o pó que sobra na peneira antes de o carvão ser ensacado. Este material não tinha uma destinação específica e, por isso, acabava se tornando um problema para muitos produtores.

Gaúcho de Roca Sales, Gilberto morou no Rio de Janeiro enquanto trabalhou como comissário. Depois, estabeleceu residência nos Estados Unidos, onde tinha uma empresa de churrasqueiras. A pedido dos clientes, o aposentado foi a Brochier comprar carvão, pois sabia da grande produção do município através de um tio, que mora na cidade.

“Quando cheguei aqui, vi aquela sobra de moinha. Eu queria comprar, mas os carvoeiros queriam até me dar”, recorda. Sabendo da grande oferta dessa matéria-prima, Gilberto começou a trabalhar na fabricação do novo carvão a partir deste material, seguindo o modelo utilizado nos Estados Unidos. Para isso, foi morar em Vila Nova, no interior de Brochier, mantendo também residência no Rio de Janeiro, para onde vai a cada dois meses, aproximadamente.

Mas a base da produção não é o único diferencial da mercadoria. O carvão não gera fumaça na fabricação nem durante o consumo. Até chegar no produto ideal, Gilberto criou 14 máquinas, pois não há equipamento para este tipo de produção no país, apenas nos Estados Unidos. Contudo, elas são caras o custo para trazê-las ao Brasil seria muito alto. Outro motivo é que o maquinário de lá é feito para carvão produzido com capim e não de acácia negra ou eucalipto, como ocorre aqui. O aposentado então se dedicou à invenção, com peças encontradas em ferros-velhos.

Outra inovação é a embalagem. Foram confeccionadas seis até que se chegasse no resultado esperado. A alça tem locais para colocar o dedos e um pavio. Basta ligá-lo e está pronto. Dentro do pacote tem um acendedor, acionado através do pavio. Depois de aceso, ele consome a parte superior da embalagem, depois a base, fazendo com que o papel se rasgue e o carvão se espalhe pela churrasqueira. O cliente não precisa encostar no produto, permitindo fazer o fogo sem sujar as mãos. O aposentado patenteou a invenção.

O carvão do futuro

Cerca de R$ 300.000,00 já foram investidos na construção de um local para fabricação, testes, motores, equipamento e matéria-prima. Tudo o que sabe, Gilberto aprendeu fazendo. “Sou autoditata”, resume, afirmando que quer ficar apenas na produção, junto com a mãe, Selmira Kettermann, que sempre o apóia.

Pessoas de diversos países, como Áustria, Bélgica, Estados Unidos e Alemanha já foram conhecer a mercadoria, que está pronta para ser lançada no mercado. Para o empreendedor, este é o momento mais difícil desde o início do projeto. “Teremos um grande paradigma para transpor: ensinar o gaúcho a fazer churrasco sem fumaça.” Gilberto acredita que, daqui a 15 anos, este será o tipo de carvão mais utilizado. “Vai ser o carvão do futuro.”

Entenda a produção

* Gilberto compra a moinha e, em uma máquina, mistura com aglutinadores naturais, para que o material tenha liga;

* Deste equipamento, o produto passa para outro, onde é formatado como pequenos tijolos. Devido à condensação feita, o carvão fica com o poder calórico duplicado;

* O produto segue em pequenos carrinhos para um forno, com sistemas de ventilação, onde fica de 48 a 72 horas secando, em temperatura entre 50 e 60°C;

* Depois de seco, é embalado;

* Cada “tijolo” tem cerca de 40 gramas;

* Por ser feito da moinha, e não diretamente das árvores, o produto será sempre igual e tem de 5 a 8% de gás.

23 de maio de 2008

Teatro amador sobrevive



Eda Schaedler ainda era criança quando dois dos seis irmãos começaram a organizar um grupo de teatro na localidade de Linha Pinheiro Machado, no interior de Brochier. Ela até chegou a atuar em algumas peças, principalmente as mais sérias, pois diz ser tímida para fazer humor. Hoje, com 69 anos, a professora aposentada ajuda a manter a arte do teatro amador na área rural do município.

“Meu irmão escrevia e minha irmã era artista. Eu já não gostava de representar, mas de ajudar, coordenar”, explica Eda, que passava a limpo as peças criadas pelo irmão. Atualmente, ela leva sugestões de textos, procura figurino e ensaia o grupo, que conta com cerca de dez integrantes.

Apresentações marcam datas comemorativas
O grupo tem mais de 50 anos, mas ainda recebeu um nome. Por isso, acaba por divulgar a própria localidade nos lugares em que se apresenta. Os espetáculos geralmente ocorrem nas festas do município, das comunidades e da Ordem Auxiliadora das Senhoras Evangélicas (Oase), além de participarem da Kulturtreffen e de eventos organizados para datas comemorativas, como o Natal e o Dia do Colono.

Os ensaios ocorrem, primeiro, na casa de um dos membros do grupo. Quando chega na reta final e é necessário um palco para marcar as posições, os preparativos são realizados na chamada “Casa da Oase”, em Pinheiro Machado. A média é de um ensaio por semana. Contudo, a rotina aumenta para até três encontros semanais quando se está às vésperas de uma apresentação.

A maioria dos participantes tem idade entre 40 e 50 anos. “Temos alguns jovens, mas, atualmente, ninguém mais quer assumir compromisso”, lamenta a aposentada que, assim como os demais integrantes, tem o teatro como um lazer e uma forma de diversão.

História é contada através da arte
A maioria das peças encenadas pelo grupo de teatro de Linha Pinheiro Machado é de gênero humorístico. Segundo Eda Schaedler, é um humor antigo. “Os textos são sobre a chegada dos primeiros automóveis e de novas tecnologias”, revela a professora aposentada. Apresentadas em alemão, os teatros tratam também das expressões erradas em português e na língua germânica. Através dos temas e da forma de encenação, o grupo acaba ensinando muito da história do município para quem não viveu aquele tempo.Atualmente, existem outros grupos de teatro amador em Brochier, um em Novo Paris e outro em Nova Holanda, segundo Eda. Ela considera pouco, pois esta prática era bastante comum há anos atrás. “É uma pena que as pessoas não queiram mais este tipo de compromisso.”

16 de maio de 2008

Super atual


Quando Samuel Guilherme Pittelkow nasceu, a banda Os Atuais já estava há 14 anos no mercado musical. Hoje, aos 26 anos, o agente administrativo marataense coleciona todos os álbuns produzidos pelo grupo, entre vinis e CDs. Samuel conta que começou a ouvir Os Atuais devido a cultura da região em relação ao estilo musical, no qual a banda se enquadra.

A primeira vez que assistiu a um show dos artistas foi em 2000. “Mas ainda não era fã, comecei a colecionar há quatro anos.” Desde então, foram cerca de R$ 500,00 gastos com discos e CDs. O mais caro custou R$ 80,00. “É um LP muito raro”, destaca.

Para adquirir todas as obras mais antigas do grupo, o marataense procurou em diversas lojas de cidades como Montenegro, Canoas, São Leopoldo e Porto Alegre. “Muitos sabem que eu gosto e me oferecem.” No total, Samuel tem 40 álbuns da banda, entre vinil e CD, contando coletâneas.

Depois de gostar da música, o agente administrativo passou a se interessar pela história de Os Atuais. “Antigamente as canções eram somente tocadas. Eles foram alguns dos primeiros que começaram a cantar este tipo de música e acrescentaram novos instrumentos, como os sopros.”

Nos últimos anos, Samuel já foi a diversos shows e bailes da banda. Inclusive, conversou com todos os integrantes do grupo. Graduando em Geografia, o estudante espera concluir a faculdade em, no máximo, dois anos. Para animar sua festa de formatura, Samuel sonha em poder contratar Os Atuais.

Todo cuidado é pouco
O marataense tem dois aparelhos toca-discos e conta que ouve os vinis quase que diariamente, mais do que os CDs. Todos os LPS são guardados com muito cuidado, sendo que apenas Samuel os manuseia. Ele também não empresta seus discos, apenas se tiver uma cópia idêntica. “Tem pessoas que não cuidam”, justifica.

O estilo bandinha é o preferido de Samuel, que possui também diversos álbuns dos grupos Hello e Corpo e Alma. Ele também acompanha bandas mais recentes, como JM e Brilha Som. No total, são 250 discos de vinil, além de dezenas de CDs. O gosto pela música nunca passou de lazer. “Fiz aulas, tenho um violão e uma guitarra, mas não consegui conciliar com o estudo e o trabalho.”

2 de maio de 2008

O amor pelas plantas


É herança de família. O gosto pelas plantas veio da avó paterna e da mãe de Cleonísia Bohn Musskopf, passado para ela e para as duas irmãs. Com o tempo e com a prática, a professora aposentada aprendeu a cuidar daquelas que hoje são suas companheiras. Em casa, na cidade de São José do Sul, ela cultiva mais de 400 vasos com as mais variadas espécies de plantas. Só de cáctus, são cerca de 30 tipos diferentes.

As folhagens chamam a atenção de quem passa em frente à casa de Cleonísia, seja pela quantidade ou pela preservação. Todas recebem o carinho e a atenção da aposentada diariamente. “De manhã, olho para todas elas e as cumprimento. Sempre converso com elas. Tem gente que acha que eu sou louca”, brinca.

Pelo prazer de cultivar
A professora sempre cultivou plantas nas cidades onde morou, como em São Pedro da Serra e em Brochier. A “coleção” aumentou há quatro anos, quando ela se mudou para São José do Sul. Cleonísia compra algumas espécies e depois replanta. Ela enfatiza que não tem o objetivo de obter renda com a produção, assim como sua mãe e sua avó também não tinham. “É um passatempo, faço por prazer.”

Todos os dias, pelo menos por alguns instantes, a são-josense se dedica às plantas, cuidando, repondo terra e adubo e tirando as folhas secas. Por alguns momentos, ela também olha e aprecia cada uma. As folhagens são as companheiras da aposentada que, hoje com 74 anos, não têm filhos. Cleonísia afirma que não tem nenhuma espécie da qual gosta mais. “Se preferir uma, a outra fica triste.”

Atividade requer dedicação e carinho
No inverno, assim como o ser humano sente a queda da temperatura, as plantas sofrem com o frio. Para evitar que as folhagens sejam prejudicadas, Cleonísia as guarda em um galpão, nos fundos de casa. Apesar do trabalho de deslocar os mais de 400 vasos, a aposentada não se intimida e faz tudo sozinha.

Ela conta que muitos, sabendo do seu gosto, lhe dão vasos para cultivar as plantas. Em algumas festas municipais, são as plantas de Cleonísia que enfeitam as mesas. É um estímulo para continuar seu trabalho, que deverá continuar solitário, pois a professora não gosta que outros mexam nas suas plantas. “Eu gosto de cuidar. Dizem que, se outras pessoas mexem, elas morrem.”

25 de abril de 2008

Erva-mate feita em casa


Ela tem espaço garantido no rancho de qualquer família gaúcha. Através de diversas variedades, a erva-mate é que garante o bom chimarrão de todo dia. O aposentado João Teles Gonçalves, de Linha Canjerana, em Salvador do Sul, também tem suas preferências quanto ao produto. Seja mais fino ou encorpado, ele não precisa escolher através dos rótulos nos supermercados. A erva do seu chimarrão ele mesmo produz.

A herança é de família. Desde pequeno, seu Teles, como é conhecido, trabalhava com erva junto do pai. “Me criei neste meio. Mas me mudei para Santa Catarina, onde o clima não é bom para o cultivo, e acabei deixando a erva de lado.” Vinte anos depois, o aposentado voltou ao Rio Grande do Sul, retomando o aprendizado que herdara.

Teles iniciou cultivando e vendendo mudas. Contudo, os compradores pagavam um preço muito baixo. A alternativa foi começar a produzir a erva, atividade para qual era preciso um soque. “A minha mulher e os meus filhos deram risada quando eu disse que iria construir um. Trabalhava dia e noite. Fiquei muito feliz no primeiro dia em que ele funcionou.”

O próximo passo foi fazer um secador, objetivo alcançado com o auxílio da Emater/RS – Ascar e da Administração Municipal. Há seis anos, Teles e a esposa produzem, mensalmente, cerca de 60 quilos de erva-mate, vendidos para amigos e vizinhos e para uso da família. “Somos aposentados e a erva não é base da nossa renda. Trabalho nisso por lazer, porque gosto.” Atualmente, ele é o único produtor de erva-mate do município.

O segredo de uma boa erva
Para produzir uma erva-mate de qualidade, é preciso seguir alguns passos importantes. A primeira etapa é plantar as mudas e cultivá-las por três anos. A partir deste período, pode ser feita uma colheita por ano. O corte não pode ser muito drástico, deixando cerca de 20% do pé, para que ele não seja prejudicado. “Tem que ser em lua minguante, para a erva não ficar muito forte”, ressalta Teles.

Com lenha fina, o aposentado faz fogo com labaredas altas e passa os galhos de erva para que percam a umidade e o produto não fique tão amargo. “Não pode deixar pegar fogo, é só dar uma chamuscada.” O próximo passo é colocar as folhas na câmara de secagem, onde ficam cerca de três dias. No final deste processo, o cheiro da erva já se torna familiar.

Em uma cancha, as folhas são batidas para que diminuam de tamanho antes de serem levadas ao soque, última etapa do processo. Dependendo da umidade, a erva fica entre 30 minutos e uma hora sendo moída. Quando está bem esmigalhado, o produto vai para um depósito, preferencialmente de madeira, em local escuro, para não perder a cor. Depois é só tomar o chimarrão.


18 de abril de 2008

Montenegro


Esta é a minha cidade, Montenegro, a "Cidade das Artes". Apesar dos problemas que são inevitáveis em qualquer lugar do mundo, Montenegro é um exemplo de município que está se desenvolvendo sem perder o ar e o jeito de cidade pequena, onde todos se conhecem e vivem em comunidade.

Acredito que a origem é algo importante, seja em relação a pessoas, lugares ou objetos. Com este vídeio, quero mostrar a origem dos municípios
que retrato no blog através das histórias e dos personagens. Montengro é a cidade-mãe desses locais (BRochier, Maratá, Salvador do Sul e São josé do Sul) que servem como pano de fundo de cada postagem.

A montagem acima foi feita pelo peão farroupilha da 15ª Região Tradicionalista de 2007, Leonardo Mousquer, com fotos disponpiveis no site da Prefeitura Municipal de Montenegro (www.montenegro.rs.gov.br)
.

14 de abril de 2008

Vivendo para o trabalho


Para ele, não há diferença entre domingo e segunda-feira. A rotina é sempre a mesma: acordar cedo e trabalhar. Isso não é uma obrigação. Nos olhos e no sorriso do agricultor Celso Emílio Muller, de 46 anos, logo se vê a paixão pela lavoura.

O marataense, morador de Boa Esperança, trabalha com criação de peixes, lima, manga e cana-de-açúcar, entre outras culturas. Ele é solteiro e reside com os pais. Seu objetivo para o futuro é terminar a casa que começou a construir junto às terras que cultiva. As estradas de acesso às plantações foram construídas por ele.

Celso mora e trabalha em uma região privilegiada. No último inverno, o caminho mostrava os resultados da geada, com os campos queimados, principalmente as plantações de cana. No alto do município, onde ficam as terras do agricultor, nem parecia que tinha feito frio, pis as canas continuavam verdes e prontas para a colheita.

Além da boa localização, Celso garante que a forma de manejo da terra é um fator importante para a qualidade daquilo que produz. “Eu não uso nada, nem esterco ou calcário.”

Fora do comum

Outra curiosidade da lavoura de Celso é o cultivo de frutas e folhagens pouco comuns, como a lima e a cica. Mais de 2.000 de pés de lima estão carregados de frutos de extrema qualidade, segundo o secretário de Agricultura e Meio Ambiente de Maratá, Ênio Becker. “Existe pouca produção na região.”

Vendidas por preços altos em floriculturas, as cicas são muitos procuradas para projetos de paisagismo. Celso não vende as que ele cultiva de jeito nenhum. Para atingir um metro de altura, as folhagens levam 33 anos. Hoje, o agricultor tem 650 pés e só pensa em comercializá-los assim que tiver mais mudas prontas. “Demora muito para crescer. Se vendo tudo agora, não tenho depois.”

31 de março de 2008

O passado no porão de casa


O sorriso nos lábios, o brilho nos olhos e a empolgação ao descrever cada objeto revelam que muito amor e tempo foram dedicados à causa. Professora durante 46 anos e catequista por 52, a moradora de São José do Sul Imelda Verônica Gabbardo hoje tem outra ocupação. Aos 71 anos, há quatro ela cuida de um pequeno museu montado no porão da antiga casa em que residia.

Imelda não sabe quantas peças compõem seu arquivo. Certamente, são centenas de objetos colocados cuidadosamente em cenários como há dezenas de anos, reconstituindo quartos e cozinhas. Todos pertenciam a seus pais, de origem alemã, ou a seus sogros, que eram italianos.

O museu fica em uma casa de 128 anos, utilizado como salão de baile e, em 1921, transformado em residência pelos sogros de Imelda. Quando a aposentada casou com Cestilho, em 1957, se mudou para o lugar e morou lá até 1992, quando o casal construiu uma nova casa nova. A morada centenária passou a ser usada como depósito.

“Eu tinha uma empregada que trabalhava muito e, um dia, ela sugeriu que a gente limpasse e pintasse o porão”, conta a são-josense, relembrando como começou a organizar o antiquário. Muitas coisas que tinha em casa e utilizava no dia-a-dia, a ex-professora limpou, restaurou e colocou no museu.

Doações e visitas ao museu
Imelda lamenta ter demorado a dar valor aos objetos antigos. “Muitas coisas coloquei fora ou doei.” Entre as peças mais queridas estão livros em alemão e italiano, utensílios de cozinha, aventais, colchas e panos de parede do enxoval da sua mãe. Alguns objetos, ela ganhou ou trocou com as irmãs e com as cunhadas. Outras, a aposentada deixa de utilizar em casa e leva para o museu.

Muitos procuram a família Gabbardo para comprar antiguidades, mas a são-josense não põe nada à venda, pelo contrário, aceita doações. A comunidade local e escolas organizam visitas ao espaço.

Para Imelda, cuidar do museu é um prazeroso passatempo. “Fico decorando, limpando, mudando os objetos de lugar. Gosto de arrumar e recordar cada momento. Só espero que Deus continue me dando forças e saúde para continuar”, afirma, destacando o desejo de que seus filhos dêem continuidade ao seu trabalho.

24 de março de 2008

De ouvidos e coração abertos para a arte



Quando tinha apenas dois anos, um surto de sarampo tirou a audição de Sandra Gausmann Pfitscher, hoje com 58. “Naquela época, não tinha vacina”, recorda. Percebendo a dificuldade da filha e sem a opção de escolas especializadas, o pai de Sandra logo se preocupou em ensiná-la a ler lábios e a pronunciar as palavras, desenvolvendo a fala. Atualmente, Sandra se comunica muito bem com suas alunas de artesanato da Oficina Municipal de Artes (OMA) de Salvador do Sul.

Foi graças à dedicação do pai que a então menina pôde cursar as séries regulares na idade correta. Sandra ingressou, inclusive, na Universidade do Vale do Rio dos Sinos (Unisinos), onde estudou História, mas não chegou a concluir a graduação. “Era muita palestra e apresentações audiovisuais”, justifica.

Mãe e dona-de-casa
Como dona-de-casa, a artesã criou quatro filhos. Há seis anos, ela se tornou membro do quadro de funcionários da Prefeitura, atuando, primeiramente, na Biblioteca Pública. Depois, passou a lecionar as oficinas de artesanato, que ela confecciona desde os nove anos. “Como eu não podia participar de cursos, minha mãe começou a me ensinar em casa.”

Todo o conhecimento adquirido com a mãe, Sandra tem paixão por passar adiante. Além disso, as aulas são um modo de estar sempre em contato com novas pessoas. “Os filhos crescem, vão embora e a gente fica sozinha. Gosto de reunir pessoas à minha volta. Com as oficinas, me sinto bastante útil”, comemora Sandra.

Uma troca de experiências
Sandra é uma professora atenciosa, segundo a estudante Débora Becker, de 19 anos, que participa há um ano das oficinas. A artesã passa toda a semana envolvida com as atividades da OMA, ensinando crochê, tricô, fuxico, boneca de pano, bordado, entre outras técnicas. “Nunca tivemos problemas de entendimento. Só temos que ter mais cuidado para falar pausado e articulado que ela entende tudo”, conta Débora.

12 de março de 2008

Mais de 50 anos no escuro



Em sua pequena casa, com apenas três cômodos, Remigio Allebrandt escuta rádio enquanto prepara o almoço no fogão à lenha. Morador da localidade de Chapadão, interior de Brochier, o agricultor não precisa mais gastar seis pilhas grandes para ouvir música. O aparelho de som agora fica ligado à luz.

Remigio nasceu na casa onde mora, há mais de 50 anos. Até pouco mais de um ano, ela não tinha energia elétrica. Um orçamento feito em 2001 apontou que seriam necessários R$ 8.000,00 para a instalação da rede, valor que Allebrandt não tinha como pagar. Através do programa Luz para Todos, do governo federal, o agricultor ganhou um kit com o poste, caixa de luz, lâmpadas e tomadas.

Sem energia, Remigio vivia como os antepassados. Para conservar a carne, secava com fumaça, fazendo uma espécie de charque. A comida produzida tinha de ser consumida antes que estragasse. À noite, a casa era iluminada por velas, o que gerava risco de incêndio, pois a residência é toda em madeira.

Para se manter informado, o agricultor conversava com os vizinhos e amigos. Agora, Remigio sabe tudo que acontece no mundo através da televisão, que ganhou de um sobrinho, que também deu uma geladeira. “É muito bom”, resume.

10 de março de 2008

O começo

O interessante da vida é experimentar. É isso que estou fazendo. Escrever em um blog nunca foi uma pretensão, mas virou uma realidade.

Aqui está, portanto, a primeira postagem do Histórias Rurais, uma ferramenta que se propõe a ser um "diário" da vida dos agricultores e moradores de municípios pequenos do Vale do Caí.

Mais precisamente, você vai ler algumas histórias sobre os residentes de Brochier, Maratá, Salvador do Sul e São José do Sul. São relatos de como eles ainda sobrevivem do setor primário, expondo suas rotinas, experiências e superações.

Neste blog, você ainda pode enviar dúvidas sobre agricultura e sobre como é a vida nessas cidades.
Seja bem-vindo!